sexta-feira, novembro 30, 2007

Choro!

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
as crianças violadas
nos muros da noite
húmidos de carne lívida
onde as rosas se desgrenham
para os cabelos dos charcos.

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
diante desta mulher que ri
com um sol de soluços na boca
— no exílio dos Rumos Decepados.

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
este sequestro de ir buscar cadáveres
ao peso dos poços
— onde já nem sequer há lodo
para as estrelas descerem
arrependidas de céu.

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
a coragem do último sorriso
para o rosto bem-amado
naquela Noite dos Muros a erguerem-se nos olhos
com as mãos ainda à procura do eterno
na carne de despir,
suada de ilusão.

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
todas as humilhações das mulheres de joelhos nos tapetes da súplica
todos os vagabundos caídos ao luar onde o sol para atirar camélias
todas as prostitutas esbofeteadas pelos esqueleto de repente dos espelhos
todas as horas-da-morte nos casebres em que as aranhas tecem vestidos para o
sopro do
silêncio
todas as crianças com cães batidos no crispar das bocas sujas
de miséria...

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro...

Mas não por mim, ouviram?
Eu não preciso de lágrimas!
Eu não quero lágrimas!

Levanto-me e proíbo as estrelas de fingir que choram por mim!

Deixem-me para aqui, seco,
senhor de insónias e de cardos,
neste ódio enternecido
de chorar em segredo pelos outros
à espera daquele Dia
em que o meu coração
estoire de amor a Terra
com as lágrimas públicas de pedra incendiada
a correrem-me nas faces
— num arrepio de Primavera
e de Catástrofe!

[José Gomes Ferreira]

Cala-te...

Cala-te, voz que duvida
e me adormece
a dizer-me que a vida
nunca vale o sonho que se esquece.

Cala-te, voz que assevera
e insinua
que a primavera
a pintar-se de lua
nos telhados,
só é bela
quando se inventa
de olhos fechados
nas noites de chuva e de tormenta.

Cala-te, sedução
desta voz que me diz
que as flores são imaginação
sem raiz.

Cala-te, voz maldita
que me grita
que o sol, a luz e o vento
são apenas o meu pensamento
enlouquecido….

(E sem a minha sombra
o chão tem lá sentido!)

Mas canta tu, voz desesperada
que me excede.
E ilumina o Nada
Com a minha sede.

[José Gomes Ferreira]

terça-feira, novembro 27, 2007

Contrastes


sábado, novembro 24, 2007

Em louvor das gaivotas

Enquanto leio sonolento um romance
de Camilo, um vento
desabrido e alegre varre as dunas.
Leva consigo toldos, roupas, crianças.
Quando mais tarde a luz,
esta tão leve luz meridional
regressa, já as gaivotas
são senhoras das areias
e, minuciosas, de maneira exemplar,
destroem tudo quanto é ainda
a mal cheirosa memória humana
numa espécie de paixão –
digo-vos.

[Eugénio de Andrade]

sexta-feira, novembro 23, 2007

Curva

Antes não nos pesava
O passado, colhíamos os dias
Ainda verdes, a frescura da sua polpa
Na vontade dos nossos
Dedos.

Depois vieram os sinais
dos primeiros cansaços sem remédio,
a noite fincou-se nas pedras,
fez-se de estorvos.

Aquilo que sobrou de ti
cabe-me nos bolsos
e é pouco para as minhas mãos.

Geografia das Estações
[RUI PIRES CABRAL]

O amor que sinto

O amor que sinto
é um labirinto.

Nele me perdi
com o coração
cheio de ter fome
do mundo e de ti
(sabes o teu nome),
sombra necessária
de um Sol que não vejo,
onde cabe o pária,
a Revolução
e a Reforma Agrária
sonho do Alentejo.
Só assim me pinto
neste Amor que sinto.

Amor que me fere,
chame-se mulher,
onda de veludo,
pátria mal-amada,
chame-se "amar nada"
chame-se "amar tudo".

E porque não minto
sou um labirinto.

[JOSÉ GOMES FERREIRA]

(In) diferença

Os dias não eram diferentes,
Ou eu não sabia comparar
Só sei que talvez eu saiba
Não saber mudar

A cor da pele fascina
A cor da pele permite bronzear
A cor da pele queima
A cor da pele vai te ajudar

A loucura é saudável
A ousadia é importante
A rebeldia é controlável
A independência é repugnante

Será que há diferença?
Ou é apenas outro jeito de enxergar
Às vezes parece que não vemos nada
E que os olhos são só para enfeitar

[Edney Souza]

quinta-feira, novembro 22, 2007

Das Utopias

Se as coisas são inatingíveis... ora!
não é motivo para não querê-las.
Que tristes os caminhos, se não fora
a mágica presença das estrelas!

[Mário Quintana]

CHOVE!

Chove...

Mas isso que importa!,
se estou aqui abrigado nesta porta
a ouvir a chuva que cai do céu
uma melodia de silêncio
que ninguém mais ouve
senão eu?

Chove...

Mas é do destino
de quem ama
ouvir um violino
até na lama.

[José Gomes Ferreira]

E por que haverias de querer

E por que haverias de querer minha alma
Na tua cama?
Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas
Obscenas, porque era assim que gostávamos.
Mas não menti gozo prazer lascívia
Nem omiti que a alma está além, buscando
Aquele Outro. E te repito: por que haverias
De querer minha alma na tua cama?
Jubila-te da memória de coitos e de acertos.
Ou tenta-me de novo. Obriga-me.
[HILDA HILST]

sábado, novembro 17, 2007

Acorrentado


Cais da eterna mansidão


Memórias


A onda


À morte

Morte, minha Senhora Dona Morte,
Tão bom que deve ser o teu abraço!
Lânguido e doce como um doce laço
E como uma raiz, sereno e forte.
Não há mal que não sare ou não conforte
Tua mão que nos guia passo a passo,
Em ti, dentro de ti, no teu regaço
Não há triste destino nem má sorte.
Dona Morte dos dedos de veludo,
Fecha-me os olhos que já viram tudo!
Prende-me as asas que voaram tanto!
Vim da Moirama, sou filha de rei,
Má fada me encantou e aqui fiquei
À tua espera... quebra-me o encanto!

[Florbela Espanca]

sexta-feira, novembro 16, 2007

Frésias

Uma pátria tem algum sentido
quando é a boca
que nos beija a falar dela,
a trazer as suas sílabas
o trigo, as cigarras,
a vibração
da alma ou do corpo ou do ar,
ou a luz que irrompe pela sala
com as frésias
e torna, amigo, o coração leve.

[Eugénio de Andrade]

Antes de Ti

Da comédia da instrução

O juiz de instrução: neste processo, tu insinuas que a minha mulher está apaixonada por ti

O poeta: eu falo da minha terra, digo que eu estava nela antes de ti e que ela se lembrará sempre de mim, antes de ti
Tu podes ser o esposo, mas eu amei-a antes de ti
e encontrarei sempre o caminho do seu coração, antes de ti
Tu podes comprar-lhe perfume, mas eu aspirá-lo-ei antes de ti
Tu podes oferecer-lhe as roupas mais caras
mas ela usá-las-á para mim, antes de ti
Eu fumei antes de ti nos seus joelhos
E assustei-a com os meus cigarros, antes de ti
Até na cama ó infeliz,
Eu entrarei, no dia do casamento, antes de ti
Tu serás o marido, mas
Em pensamento, eu estreitá-la-ei antes de ti
Eu estarei sempre entre vós dois
Triste, mas antes de ti

[Rachid Hussain]

quarta-feira, novembro 14, 2007

Futurista


Folhas


Alameda


Lisboa noctívaga


terça-feira, novembro 13, 2007

Abate ILEGAL dos animais do canil de Olhão - Online Petition

Assinem aqui contra esta barbaridade:
http://www.gopetition.com/online/15036.html

A LOAAA, associação de carácter benemérito, sem finalidade
lucrativa, constituída em 22.06.1987, com declaração de instituição
com utilidade pública reconhecida por despacho publicado no Diário da
República, vem denunciar a situação que está a ocorrer em Olhão,
altamente violadora dos direitos dos animais e da própria dignidade e sensibilidade humana.

A LOAAA tem como objecto e objectivo inscrito nos seus estatutos, a
promoção de acções e actividades de defesa dos direitos dos animais,
em especial dos abandonados, com vista à consciencialização da
população olhanense e das entidades oficiais no sentido da protecção
dos animais, da salvaguarda da imagem e da saúde pública de Olhão e da
dignificação e humanização do tratamento dos animais.

A Câmara Municipal de Olhão, no âmbito dessa colaboração, acedeu na
disponibilização de um espaço, em zona camarária para que aí se
edificasse canil da Associação. Foi cedido o espaço e lá funcionou
desde 1987. Ou seja, é um Canil da Liga e não um Canil da Câmara!
Sempre foi a Liga, com as ajudas das quotas dos seus sócios, que
pagaram a alimentação, campanhas de adopção, serviços de saúde e não a
Câmara Municipal de Olhão.

Sucede, que nos inícios de Setembro de 2007, o funcionário camarário,
Fernando Florival Pedada, chefe de Cantoneiros, proibiu a Presidente
da Liga, bem como as colaboradoras, de entrarem nas instalações,
alegando que tinha ordens do Presidente da Câmara, o Eng. Francisco Leal, para tal.

Acrescentou que tinha agora como missão "dizimar tudo quanto fosse
cães e gatos que ali houvesse, para limpar o local e acabar de vez com o canil".

Já se sabia que aqueles terrenos iriam ser alvo de reestruturação,
para a instalação de um Hotel e condomínio de luxo.

Foi pedida uma audiência com o Presidente da Câmara, ao qual este
respondeu que brevemente se iria realizar.

O certo é que até hoje essa audiência não se realizou.

Na altura existiam no local cerca de 200 cães e um número incerto de
gatos.

Na primeira semana de Outubro de 2007, preocupadas com a saúde e
bem-estar dos animais, a Presidente da Liga mais algumas colaboradoras
tentaram novamente ter acesso ao canil, acesso que mais uma vez foi
negado e que em conversa acesa com Fernando Pedada, este disse
inclusive que não devolvia a carrinha pertencente à Liga " pois o iria
utilizar para recolher os animais da rua, levá-los para o canil para
os matar, e que a população ainda lhe iria agradecer".

Tal veículo foi recuperado sob intimação policial.

No dia 20 de Outubro, pela noite, uma pessoa que trabalha nas
instalações mas que prefere o anonimato, por medo de represálias,
comunicou à Presidente da Liga que só nessa noite tinham acabado de
ser mortos 50 a 60 cães.

Esta situação, que aquele funcionário descreveu como uma MATANÇA, foi
levada a cabo pelo funcionário Fernando Pedada e pelo veterinário
Jorge Bomba.

Entre os animais abatidos, encontrava-se uma cadela grávida e prestes
a parir, e a restante maioria era de cães saudáveis.

Os animais abatidos nessa noite, foram transportados por um camião da
Câmara e despejados do aterro sanitário de S. João da Venda.

A justificação que apresentaram é que os animais estavam todos
doentes, o que é facto confirmado que não o estavam, e o veterinário
Jorge Bomba ainda referiu que como sendo abandonados, não podiam
permanecer mais de 15 dias no Canil.

Os animais não eram abandonados, eram propriedade da LOAAA, que
nalguns casos, já cuidava deles há vários anos.

A LOAAA claramente manifestou, de forma inequívoca, que não consentia
no abate dos seus animais.

Desde então, continuam a morrer animais indiscriminadamente, e de
forma cruel. Fernando Pedada, usa uma arma para andar aos tiros com os
animais, sem ter qualquer competência para o fazer, Jorge Bomba,
ignora todos os princípios de ética contra a violação da legislação
que protege os animais, e mais grave abusa da profissão que abraçou,
Eng. Francisco Leal, está a ser conivente com tudo isto e depois
desmente e boicota reportagens sobre os factos descritos, e ainda lá
está mais um " bondoso" para a "limpeza da cidade de Olhão", chamado
Alberto Almeida.

Com as preditas atitudes, que ofendem a dignidade de todas as pessoas
de bem e dão da instituição que as comete uma ideia de um primário
barbarismo, parece estar a regredir-se nos patamares civilizacionais.

Interrogamo-nos todos como pode isto acontecer num município da Europa!

Está a ser violada claramente a Declaração Universal dos Direitos dos
Animais, e a sensibilidade de todas as pessoas de bem.

Parece-nos também flagrantemente violada a arte medico-veterinária por
ofensa flagrante à dignidade animal, ao impor um veterinário numa
morte desnecessária a um grande número de animais.

Estamos a tratar de seres vivos que necessitam de assistência
permanente e de serem resguardados de uma morte certa.

Ajudem-nos nesta demanda!

Se quiserem manifestar o vosso desagrado ou repúdio por esta situação
o email da Câmara de Olhão é geral@cm-olhao.pt

os signatários, por tudo o que já foi exposto, estamos dispostos a
defender as leis que protegem os animais e condenar nacionalmente e
internacionalmente, os perpetradores deste massacre hediondo!

Não resta dúvidas que quem responderá mais por isto, será o Autarca
responsável e todo o Concelho terá repercussões negativas a todos os
níveis ( comércio, turismo, desenvolvimento, investimentos...)

Por isso, ainda temos a humildade, de vos pedir que não continuem a
levar a cabo esta barbaridade, que se abram inquéritos e sejam
chamados os bárbaros, à Justiça!!

*Petition:*

Vamos acabar com estas injustiças!!!!
Por favor, ajudem-nos!
Temos que salvar estas vidas!
Obrigada

http://www.gopetition.com/online/15036.html

quinta-feira, novembro 08, 2007

Medíocre

Nas palavras encontro a paz
Que acalma minha inquietude
E meu temor se desfaz

Buscando nos versos a plenitude
De um dia mal concluído
Repensando minha atitude

Percebo que fui mal entendido
Não por aqueles que me cercam
Mas por mim mesmo iludido
Os meus erros corrigiram
E só enxerguei a falha alheia
Mostrando que se enganaram

Mas a vida é uma teia
Que nos prende diariamente
Do desjejum até a ceia

Nos castiga de forma diferente
Perturbando nossa razão
Repetindo os tropeços em nossa mente

Afligindo nosso coração
Mostrando que há momentos para falar
E outros para usar a audição

Nos versos começo a enxergar
As cicatrizes da minha ansiedade
E amanhã espero reparar

Os reflexos da minha mediocridade

Edney Souza®

quarta-feira, novembro 07, 2007

Primeira Pessoa

Construo
Destruo
Reconstruo
Acostumo

Falo
Esqueço
Lembro
Padeço

Começo
Termino
Altero
Desanimo

[Edney Souza]

terça-feira, novembro 06, 2007

Saudade

Saudade sentimento que arde
Ao passar por ti, o corpo invade
Sem maldade, lhe rouba a paz
Molha o rosto com lagrimas que trás

Sorrir nesta hora se torna arte
Fingir ser feliz, também faz parte
De quem sente saudade voraz
E de te esquecer é incapaz

O seu olhar me traz alegria
O doce canto na aurora
Que por dentro me devora

A presença saudosa transcende em sonho
Contemplar-te dissipa o pranto
Pois meu amor é metamorfose do eterno

[Teresa Cordioli]

segunda-feira, novembro 05, 2007

Talvez não saibas

Talvez não saibas mas dormes nos meus dedos
aonde fazem ninho as andorinhas
e crescem frutos ruivos e há segredos
das mais pequenas coisas que são minhas

Talvez tu não conhecas mas existe
um bosque de folhagem permanente
aonde não te encontro e fico triste
mas só de te buscar fico contente

Talvez não saibas mas digo que te amo
e construí no mar a nossa casa
que é por ti que pergunto é por ti que chamo
se a noite estende em mim a sua asa

Talvez não compreendas mas o vento
anda a espalhar em ti os meus recados
e que há um pôr do sol no pensamento
quando os dias são azuis e perfumados

Oh meu amor, quem sabe se tu sabes
sequer se em ti existo ou sou demora
ou sou como as palavras, essas aves
que cantam o teu nome a toda a hora.

Joaquim Pessoa

Reflexivo