segunda-feira, janeiro 14, 2008

INDECISÃO

Encostado à porta do palheiro, o homem
não se queixa do Inverno. Recebe na cara o
vento norte, e adivinha a chuva que não irá
cair. Ouve os porcos que escorregam
na pocilga; e vê as vacas que se encostam
ao cercado, como se quisessem sair
para o pasto. As árvores já deram o que
tinham a dar; no quintal, os legumes
esperam quem os apanhe. O homem
aproveita o frio da tarde para pensar
o que fazer. Para além dele, só
os pássaros esperam que alguma
coisa mude; ou nem isso, e equilibram-se
na árvore como se a noite estivesse
para chegar. As mãos do homem estão
sujas de lama; e os olhos há muito
deixaram de procurar um alvo fixo,
perdendo-se no cinzento indefinido
da angustia. Dentro dele, porém,
algo procura uma saída; e não deixa
que o vento o curve para terra, como
sucedeu aos arbustos da colina. E
descobre um resto de azul no fundo
do céu. Sabe que o seu caminho se
encontra nessa direcção, que o
tempo irá mudar, e que no dia previsto
não precisará de se encostar à porta
do palheiro, para receber o vento
norte, nem de imitar a indecisão
dos pássaros que o tempo enganou.

[Nuno Júdice]

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