sábado, fevereiro 24, 2007

BASTA PENSAR EM SENTIR

Basta pensar em sentir
Para sentir em pensar.
Meu coração faz sorrir
Meu coração faz chorar.
Depois de parar e andar,
Depois de ficar e ir,
Hei-de ser quem vá chegar
Para ser quem quer partir.

Viver é não conseguir.

Fernando Pessoa

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

PASSAM NA RUA OS CORTEJOS

Passam na rua os cortejos
Das pessoas existentes.
Algumas vão ter ensejos,
Outras vão mudar de fato,
E outras são inteligentes.

Não conheço ali ninguém.
Nem a mim eu me conheço.
Olho-os sem nenhum desdém.
Também vou mudar de fato.
Também vivo e também esqueço.

Passam na rua comigo,
E eu e eles somos nós.
Todos temos um abrigo,
Todos mudamos de fato,
Ai, mas somos nus a sós.

Fernando Pessoa
[Lisboa, 1888-1935]

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Surdo, Subterrâneo Rio

Surdo, subterrâneo rio de palavras
me corre lento pelo corpo todo;
amor sem margens onde a lua rompe
e nimba de luar o próprio lodo.

Correr do tempo ou só rumor do frio
onde o amor se perde e a razão de amar
--- surdo, subterrâneo, impiedoso rio,
para onde vais, sem eu poder ficar?

Eugénio de Andrade

terça-feira, fevereiro 20, 2007

Little Lady


[TENHO A VENTURA FIEL]

Tenho a ventura fiel
e a ventura perdida,
uma é qual uma rosa,
a outra como um espinho.
De tudo o que me roubaram
nunca fui despossuída:
tenho a ventura fiel
e a ventura perdida,
e estou tão rica de púrpura
como de melancolia.
Ai, como é amada a rosa
e que amante é o espinho!
Como duplo contorno
dos frutos gémeos vivem,
tenho a ventura fiel
e a ventura perdida…

gabriela mistral
[Vicuña, Chile, 1889- 1957]

[Tradução de josé Bento]

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

HORAS RUBRAS

Horas profundas, lentas e caladas,
Feitas de beijos sensuais e ardentes,
De noites de volúpia, noites quentes
Onde há risos de virgens desmaiadas…

Ouço as olaias rindo desgrenhadas…
Tombam astros em fogo, astros dementes,
E do luar os beijos languescentes
São pedaços de prata pelas estradas…

Os meus lábios são brancos como lagos…
Os meus braços são leves como afagos.
Vestiu-os o luar de sedas pura…

Sou chama e neve banca e misteriosa…
E sou, talvez, na noite voluptuosa,
Ó meu Poeta, o beijo que procuras!

florbela espanca
[Vila Viçosa, 1894 – 1930]

sábado, fevereiro 17, 2007

Bocas


Memória


sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Casa grande


quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Luminosidades


Ruela


Memorial



sexta-feira, fevereiro 09, 2007

Sou o fantasma de um rei

Sou o fantasma de um rei
Que sem cessar percorre
As salas de um palácio abandonado...
Minha história não sei...
Longe em mim, fumo de eu pensá-la, morre
A ideia de que tive algum passado...

Eu não sei o que sou.
Não sei se sou o sonho
Que alguém do outro mundo esteja tendo...
Creio talvez que estou
Sendo um perfil casual de rei tristonho
Numa história que um deus está relendo...

Fernando Pessoa

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Mestres


quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Vida perplexa


Poema do mar


Aqueles de um país costeiro,
há séculos,
contêm no tórax
a grandeza
sonora das marés vivas.
Em simples forma de barco,
as palmas das mãos.
Os cabelos são banais
como algas finas. O mar
está em suas vidas de tal modo
que os embebe dos vapores do sal.
Não é fácil amá-los
de um amor igual à
benignidade do mar.

Fiama Hasse Pais Brandão

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Amigos


Meditações

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.


Carlos Drummond de Andrade

Colegiais


domingo, fevereiro 04, 2007

Máquina do Tempo

O Universo é feito essencialmente de coisa nenhuma.
Intervalos, distâncias, buracos, porosidade etérea.
Espaço vazio, em suma.
O resto, é a matéria.
Daí, que este arrepio,
este chamá-lo e tê-lo, erguê-lo e defrontá-lo,
esta fresta de nada aberta no vazio,
deve ser um intervalo.

ANTÓNIO GEDEÃO

30 Anos depois


sábado, fevereiro 03, 2007

Recordações


sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Recordações


Navegações Doentes

Tenho os sintomas todos:
navegam-me fluídos
e o devaneio em barcos de desejo

os sons de trovoada
mesmo tapando ouvidos:
esclerótica paixão que não domino

tenho os sintomas todos
e assim me reconheço
acamada, incurável: na parede do fundo
navegantes os barcos

ANA LUISA AMARAL